segunda-feira, 28 de julho de 2008

Da Tortura que Tritura.

euFECHOosOLHOSeVEJOumESCUROcéu, CHEIOdeESTRELAS. éMUITOlindo,MASsóCONSIGOverTRISTEZA. mesmoPORQUEeuSEIqueTALbeleza ÉconsequênciaDEumaCONSTELAÇÃOdeFARELOS deUMAexuberanteLUA, queAsaudadeTRITUROU.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Três Acordes

Essa coisa dos três acordes, do "do it yourself", tem me impregnado, e isso tem me emancipado.

Eu sempre quis fazer música, e achava que não estava pronto. Fiquei me guardando por muito tempo, "me guardando pra quando o carnaval chegasse". E estudar pra ser um grande pianista era um projeto longínquo, e não a primeira de minhas prioridades. Ouvir Villa-Lobos é muito mais leve do que ler Nietzsche, mas ser estudioso de Villa-Lobos estava muito mais distante do que meus braços esticados poderiam alcançar do que ser estudioso de Nietzsche. Já estava de braços dados com Nietzsche - que é só um exemplo.

Acho que agora a ficha me caiu. Eu nunca farei música se ficar esperando estar pronto. Este estado não existe, existe estar se aprontando, e a vida é isso. Sempre mais e mais. De onde foi que eu tirei essa idéia de que eu tinha que saber fazer pra começar? Aprende-se fazendo, e eu me dei conta de que esperando saber, eu nunca faria e nunca, nunca mesmo, aprenderia...

A crítica literária, musical, artística, especializada, enfim, sempre elogia os "artistas que nasceram prontos". O poeta que em seu primeiro livro divide a obra em dois tomos com conceitos, cá wittgesteinianos, lá cabralinos (ou como queiram chamar); a pintora que remete, em seus traços e cores, às tendências da contemporaneidade exacerbada dessa primeira década do terceiro milênio. Puta merda! Quanta arte, beleza e invenção não cabem em uma roda de violão!

Acaba que, em nível de música, eu vinha tendo uma postura oposta, quanto a isso, da que eu tenho tido em todos os campos de minha vida. Eu esperava estar apto a uma entrada triunfal. E se antes desta entrada triunfal, eu errasse, estava disposto a apagar o passado que me maculava, pra tentar mais uma vez entrar lindamente.

Hoje eu me dou conta de que o caminho não era esse, que a banda em que fui tecladista, ou o coral em que sou barítono são possibilidades, mas não as únicas. Achava que ali dava conta por não estar sozinho, mas que não deveria arriscar sozinho, por estar me maculando. Se eu erro em grupo, tenho a desculpa de que sou apenas uma fração deste coletivo que componho, e que só uma fração do coletivo errou. Se erro solo, um erro apenas é erro de 100% dos agentes do processo.

Algum tipo de vontade de verdade me regia, quando eu evitava tocar Ednardo perto das pessoas, e só arriscava sozinho na beira da lagoa ou na minha cama, no quarto fechado. As pessoas queriam ouvir músicas que elas conhecessem, reclamavam das que ainda não conheciam. Mas quando eu tocava, nas rodas de violão, algo conhecido, ficava com a sensação de que ninguém estava nem aí.

Rodas de violão não são shows, e errar não é comprometer o sucesso do futuro. A linguagem que nos domina, e que achamos ser a nossa única, nos faz enfileirar passado, presente e futuro. Mas os famosos três acordes não precisam estar sempre na mesma ordem.

Nem precisam ser sempre os mesmos três. Porque três podem ser quatro. São dois conjuntos de três que têm dois elementos em comum. Sobreposição, intersecção. Passado, presente e futuro não passam de três acordes na harmonia de um punk rock e/ou de uma balada tocada em uma roda de violão.

A Bossa Nova (isso é uma brincadeira com essa minha pseudoteoria) não passa de vários punkrocks sobrepostos. A base de todo acorde é tríade, mesmo que ele seja tão acidentado quanto o Coyote perseguindo o Papa-Léguas. Uma canção com dois acordes, na verdade, tem três. Um deles é a somatória dos outros dois, ou é um dos outros dois, depois de ter perseguido o Papa-Léguas.

O universo se resume a três acordes. E a sequência aleatória de acordes acaba um dia se repetindo, e eternamente retornando.

Assim sendo, não custa nada macular meu passado, tocando Clash, Smiths e Legião Urbana ao invés dos estudos de Villa-Lobos. O violão é a alternativa para mostrar ao Punk Rock que ele não é absolutamente rebelde e agressivo, que ele também pode ser submetido àquela velha fórmula do banquinho, mas também para mostrar à bossa nova que emitir acordes dissonantes pode ser apenas uma forma sofisticada de sublimar um desejo inconsciente de gritar inconformismos.

É notório que preciso dizer mais uma coisinha: A questão não é ter que escolher entre dois extremos, ou entre dois objetos distintos. Punk Rock e Bossa Nova representam, aqui, dois polos de um mesmo eixo. Um único objeto, como um vergalhão. Ele não se resume às suas pontas, ou a uma delas. Nossa existência, inclusive a musical, desliza entre estes dois extremos. A palavra é gradação.

E Guimarães Rosa já nos deu a dica, quando o pai de um de seus narradores optou por inventar suas escolhas.

Pois a mesma linguagem desgastada que nos impõe a cronologia repetida e neurótica do passado, do presente e do futuro, também nos impõe que temos que escolher entre a margem de cá ou a de lá, entre o bem e o mal, o bom e o mau, o quente e o frio, o preto e o branco, o louco e o normal, o mainstream e o underground, o chic e o brega, a moda e o anacronismo.

Enfim, aquele pai rosiano escolheu por não ser obrigado a escolher entre uma das duas margens que lhe ofertaram. Ele escolheu criar a terceira.

E não, isso não é ficar no meio do rio, dentro da água. É inventar um terceiro solo pra criar. Um terceiro acorde pra fazer punk rock. Porque eu não preciso escolher entre Ramones e João Gilberto. Eu posso muito bem querer a Marisa Monte.

E ainda assim não abrir mão das outras duas opções, e das mil outras. Três não é um a mais do que dois. Três é a multiplicidade.